Por que faço uma afirmação tão
categórica? Efetivamente, a educação no país precisa de mudança, não há dúvida.
A evasão, o baixo índice de aprendizagem, a deficiência na formação do
professor são questões destacadas sistematicamente pelos especialistas.
A questão é: a
reforma proposta pela Medida Provisória 746 toca nessas questões? NÃO, é a
resposta que nos parece mais adequada.
Uma das
principais mudanças introduzidas pelo denominado “novo” ensino médio, e
apontada como vantagem, é a possibilidade que passa a ter o estudante de
escolher entre cinco “itinerários” ou áreas, aquela que pretenda se aprofundar:
matemática, linguagens, ciências da natureza, ciências humanas ou formação
técnica profissional.
Atualmente, esta
escolha é feita pelo aluno quando se propõe a ingressar na Universidade, e
não raras vezes convivem nos primeiros anos com o conflito sobre a opção feita,
cogitando frequentemente a mudança de curso.
Diferentemente
da estratégia adotada pela Universidade ao criar os bacharelados
interdisciplinares, como uma primeira etapa na qual o universitário amadurece a
escolha sobre o seu futuro percurso formativo, agora, a difícil decisão deverá
ser antecipada.
Os jovens
serão levados a escolher seu caminho ao final do ensino fundamental. Isso
mesmo, pois terá que escolher uma escola que ofereça o itinerário que considere
ser o mais provável seguir, caso contrário, teria que mudar de escola ao final
do segundo ano, o que seria igualmente prejudicial.
Esta é uma
segunda e relevante novidade: as escolas não terão condições de oferecer todos
os cinco itinerários formativos previstos, devendo se tornar especializadas em
uma ou duas áreas. Isto porque a oferta de um terceiro ano com aprofundamento desdobra-se
na necessidade de contar com mais docentes para a área específica e
infraestrutura laboratorial.
Outra grave
consequência da mudança é a separação do ensino médio do ensino
técnico-profissional. Assim, ensino integrado, típico dos institutos federais
de Educação Tecnológica, como o IFBA e o IFBaiano, não mais poderia ser
ofertado na forma atual, caso se consolide a reforma em curso, sendo reservado
à formação técnica profissional apenas o último ano. Isto é o que se pode
concluir da análise do documento.
Um dos
aspectos mais inovadores, presentes na criação dos Institutos Federais de
Educação, Ciência e Tecnologia, é formação de cidadãos críticos,
conscientes do seu papel na sociedade, em contraposição com a formação
tecnicista, cujo foco principal e quase exclusivo era formar trabalhadores
aptos a ingressar no mercado de trabalho, sem uma perspectiva de desenvolver
suas capacidades intelectuais, criativas e inovadoras.
Por outro
lado, a formação docente é outro dos grandes desafios atuais. No entanto, ao
permitir que professores com "notório saber" possam ministrar aulas
para os cursos técnicos, a MP 746 contraria o enorme esforço proposto pela Lei
que instituiu o Plano Nacional de Educação, que fixou como meta garantir que
todos os professores da educação básica tenham licenciatura ou formação
pedagógica.
A Lei de
Diretrizes e Bases da Educação tem apenas 20 anos, e agora é mutilada com
alterações significativas.
A Rede de
Institutos Federais que promovem a Educação Profissional e Tecnológica foi
criada há apenas oito anos, alcançando rápida expansão, sendo igualmente
atingida por essa medida.
Por tudo o
exposto, estamos convencidos de que a iniciativa governamental não resolve
os problemas da educação brasileira, e pode contribuir para piorar o grave
quadro.
A Medida
Provisória, que já está valendo como se fosse lei, precisa de aprovação no
Congresso, e é indispensável que os parlamentares dialoguem com o mundo da Educação,
de modo a conhecerem as implicações desta reforma para os estudantes e a
sociedade, e que possamos conduzir mudanças efetivas para a melhoria do ensino
em nosso país.
Nilton
Vasconcelos é professor do Instituto Federal da Bahia
Publicado em A Tarde, edição de 11 de novembro de 2016