Nilton Vasconcelos
O texto abaixo reproduzido constitui parte introdutória ao Memorial apresentado ao Instituto Federal da Bahia, como exigência parcial para promoção ao cargo de Professor Titular.
INTRODUÇÃO:
A elaboração de um Memorial com vistas à
progressão para a Classe E, nos termos da Portaria N° 982 do MEC, e Lei no
12.772/2012, dar-se-á observando os critérios de I - possuir o título de
doutor; II - ser aprovado em processo de avaliação de desempenho; e III -
lograr aprovação de memorial que deverá considerar as atividades de ensino,
pesquisa, extensão, gestão acadêmica e produção profissional relevante, ou
defesa de tese acadêmica inédita.
A possibilidade de ascensão para a classe de
Professor Titular a todos os professores que alcancem o nível de Professor
Associado 4, é resultado da mobilização docente e consequente negociação com o
Estado, superando o sistema anterior de distribuição de vagas para esse estágio
da carreira.
Em 2008, é instituída a Rede Federal de
Educação Profissional, Científica e Tecnológica, e simultânea criação dos
Institutos Federais, através da Lei Nº 11.892, de 29 de dezembro. No mesmo
ano, também é estruturada a Carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e
Tecnológico - EBTT (Lei Nº 11.784, de 22 de setembro de 2008), como
carreira docente específica dos IFs. Em consequência, não mais foram ofertadas
vagas para a Carreira Docente do Magistério Superior nestas instituições,
remanescendo estes docentes, no entanto, de forma residual, e cuja promoção
está sujeita a regra específica.
Com efeito, a Resolução Nº 39/ 2014, do
Conselho Superior do IFBA, estabeleceu diretrizes gerais “para fins de promoção
à Classe Titular da Carreira do Magistério Superior”, bem como, “os parâmetros
específicos para avaliação do desempenho acadêmico como partes do processo de
acesso”. São, portanto, regras próprias para carreira do Magistério Superior.
Dispõe a mencionada Resolução que a inscrição
para Promoção para Classe Titular Docente, deverá observar apresentação de:
“I - memorial circunstanciado ou tese
acadêmica inédita, em 8 (oito) cópias...;
II – cópia do diploma de Doutorado (quando
realizado no exterior, revalidado por instituição nacional competente);
III – Ficha de pontuação de atividades para
Promoção à Classe Titular Docente preenchida, em que comprove pelo menos 100
(cem) pontos nas atividades relacionadas a ensino, pesquisa, extensão, inovação
e/ou gestão, quando a opção for pelo memorial de avaliação.”
Assim, compete a uma Comissão Especial
de Avaliação de Memorial, composta por 4 (quatro) docentes, sendo, pelo
menos, 3 (três) externos ao IFBA, o processo de avaliação para acesso à Classe
de Titular da Carreira de Magistério Superior.
Uma regra transitória da mesma Resolução
39/2014, prevê que em 2018, seja elevado para 120 (cento e vinte) o
número de pontos correspondentes às atividades docentes, conforme FICHA DE
PONTUAÇÃO DE ATIVIDADES DE ENSINO, PESQUISA, EXTENSÃO, INOVAÇÃO E GESTÃO, anexa
à mesma Resolução.
A opção que ora apresentamos é pela
modalidade de “Memorial circunstanciado”, que consiste,
basicamente, da juntada de documentos comprobatórios das atividades, de forma
sequenciada, segundo organização prevista na Ficha de Pontuação.
Neste sentido, cabem alguns esclarecimentos.
Em primeiro lugar, esclarecemos que para atendimento ao disposto da Resolução
nº 39/2014, Consup/IFBA, devem ser registradas tão somente as atividades
exercidas a partir do ingresso do docente no IFBA, desprezando-se
informações anteriores à data de 20 de junho de 2002. Em segundo lugar, a Ficha
de Pontuação contempla tipologia específica de atividades, desconsiderando, por
exemplo, publicações em jornais, manutenção de blogs e correlatos, premiações,
entre outras.
Para além das formalidades legais,
entretanto, à medida que me dedicava a reunir documentos, portarias, artigos, e
textos diversos, brotava toda uma trajetória profissional, ao longo de razoável
período de vida. Estes documentos e textos traziam ideias e debates, remetia a
lutas e concepções, que considerei relevante registrar no presente documento,
não apenas para ilustrar, mas também para tornar mais claro o percurso
cumprido. Retratado apenas em números e registros formais, acredito não
permitir uma compreensão adequada da trajetória que se pretende avaliar.
Dessa forma, além desta Introdução, consta do
presente Memorial o Apêndice Trajetória Profissional, que relata
de forma sintética a perspectiva do professor e pesquisador-extensionista, ou
como gestor, e cidadão crítico da realidade que vive. A próxima seção,
reafirmo, tem caráter complementar, não se constituindo em exigência formal
para o processo de avaliação.
Na seção “Ficha de Pontuação”, apresenta-se a
relação de documentos comprobatórios, especificando de acordo com os diversos
itens requeridos no anexo à Resolução n 39/2014 já mencionada, de modo a
facilitar a verificação por parte da Comissão Especial. As cópias dos
documentos são reunidas em volume à parte.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
A atividade docente é diversificada, por
natureza, e encontra na indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão, um princípio fundamental das universidades e dos centros
universitários de ensino, conceito este que se associa aos princípios da
autonomia e liberdade. A indissociabilidade é, inclusive, expressa no artigo
207 da Constituição de 1988, ao tratar do contexto universitário. Também a Lei
que criou os Institutos Federais, ao tratar dos Objetivos dos Institutos
(artigos 7º e 8º) se refere ao ensino, à pesquisa e à extensão.
O Prof. Eliezer Pacheco e a Profª Caetana
Rezende, em “Institutos Federais, Lei 11.892, de 29/12/2008, Comentários e
Reflexões” (MEC, 2009), consideram que os Institutos, na construção de seus
projetos pedagógicos, devem adotar como diretriz a necessidade de atuar no
ensino, na pesquisa e na extensão, bem como, compreendendo as especificidades
e as inter-relações que caracterizam a indissociabilidade dessas dimensões.
Ao lado do ensino, da pesquisa e da
extensão, também a gestão tem tido grande impacto sobre a atividade do docente,
que, com frequência, se vê na circunstância de desempenhar funções de
coordenação de cursos, de projetos de pesquisa, de extensão, ou compor
colegiados em diversas instâncias. Mais frequentemente, ainda, é convocado a
constituir comissões, grupos de trabalho, que apresentem solução para variados
temas relacionados à gestão, quando não é requerida a dedicação exclusiva a
atribuições estritamente administrativas.
É neste contexto que o exercício do mister
acadêmico permitiu a convivência com diferentes ambientes institucionais,
diferentes perspectivas de abordagem dos objetos de pesquisa, do cotidiano do
processo de ensino/aprendizagem, das experiências com a extensão, e
particularmente de gestão.
Em se tratando de um texto que discorre sobre
experiência própria, mostrou-se inevitável o uso da primeira pessoa do singular
para expressar o entendimento do autor sobre questões que afetam diretamente
sua atividade. Sempre que possível, entretanto, será adotada a voz passiva.
A revisão da trajetória acadêmica permite
observar a sistemática e produtiva cooperação desenvolvida com diversos
professores e professoras, entre os quais, a Professora Débora Nunes, da Uneb e
Unifacs, e os professores Francisco Teixeira, Tania Fischer, Antônio Pinho,
Genauto França, Maria Suzana Moura, da UFBA; o Prof. Gabriel Kraychette, da
UCSal; a Profa. Tatiana Dias Silva e o Prof. Carlos Alex Cypriano, do IFBA.
Manifesto profunda admiração pelos colegas e agradecimento pela oportunidade de
poder dividir com eles rico debate de ideias e produção acadêmica. Sem dúvida,
a interação profissional com docentes de múltiplas instituições de ensino
enriquece sobremaneira a trajetória do professor.
A minha atividade docente foi desdobramento
natural dos estudos do Mestrado e Doutorado, que me possibilitaram ministrar
disciplinas na graduação e na pós-graduação em pelo menos cinco instituições,
antes de prestar concurso, em 2002, para o Cefet-BA.
Desde que fui admitido no Centro Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia procurei contribuir no ensino, na
pesquisa, na extensão e na gestão. Meu percurso acadêmico, contudo, não esteve
dissociado de experiências de gestão apenas acadêmica, mas também em outras
instâncias da administração municipal, estadual e federal.
As temáticas a que me dediquei em qualquer
dessas frentes são fruto do engajamento político na defesa da democracia,
refletindo um olhar crítico às desigualdades presentes na construção da
sociedade brasileira, marcadamente escravagista, latifundiária, regionalmente
desequilibrada, de desenvolvimento historicamente subordinado e elitista.
Assim, para além da descrição de atividades,
procura-se apresentar neste documento as questões que a cada momento serviram
de propulsão à minha vida profissional.
Logo que concluí o curso de graduação na
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia, passei a
integrar a direção do Departamento da Bahia do Instituto dos Arquitetos do
Brasil - IAB. Foi uma decisão natural, consequência dos cinco anos de
participação no movimento estudantil universitário. A presidência do Diretório
dos Estudantes de Arquitetura possibilitou participar do movimento nacional de
estudantes de arquitetura e da representação dos estudantes em fóruns nacionais
de discussão sobre as características desejáveis para o curso, e de outros
temas relacionados ao processo de ocupação do espaço urbano, ao direito à
moradia, e à luta por direitos humanos.
Sobre o direito à moradia, pude sistematizar
em um capítulo do livro “Salvador: o arquiteto e a cidade informal”, organizado
por Débora Nunes e editado em 2000, o papel dos arquitetos, em especial do
Departamento da Bahia do IAB, na luta pela universalização do acesso à
habitação popular.
Sem dúvida, o Clube de Engenharia e o IAB
eram espaços privilegiados para o debate de temas relevantes para a cidade e
para o país, em especial, na luta por liberdades democráticas, pela Anistia
Ampla Geral e Irrestrita aos presos políticos e aos exilados, ou por uma
Constituinte Livre e Soberana. Eram estes, marcos indispensáveis à restauração
da democracia no país.
Este engajamento político e o conhecimento
das temáticas associadas às questões típicas da municipalidade propiciaram a
minha indicação para compor o secretariado da primeira experiência de um
governo municipal, em Salvador, eleito pelo voto direto, após o fim da
restrição às eleições para prefeitos de capitais e áreas de segurança nacional,
imposta pelo regime militar que tomou o poder em 1964.
A participação no governo eleito em 1985,
ocupando a função de titular da Secretaria Municipal de Serviços Públicos -
SESP, foi marcada pelas contradições típicas de um governo de frente ampla,
reunindo diferentes concepções, inclusive sobre um aspecto marcante da vida
urbana em Salvador: a informalidade do trabalho exercido em via pública. Cabia
àquela secretaria, entre outras atribuições, serviços relacionados à limpeza
urbana, à administração de feiras e mercados, assim como, aos serviços de
iluminação pública, e administrar a concessão e fiscalização de atividades
econômicas e laborais em logradouro público.
Uma visão “sanitarista”, de limpeza das ruas
de atividades que “enfeavam” a paisagem urbana, expondo as desventuras da
informalidade, prevalecia na administração, cuja atuação, através do famigerado
“rapa”, gerava conflitos com a visão que prevalecia na pasta sob a nossa
responsabilidade. Por outro lado, era preciso assegurar que o alcance dos
objetivos relacionados à ordenação do comércio informal não inviabilizasse a função
primordial de geração de ocupação e renda, permitindo a sobrevivência de
milhares de famílias. Ali iniciaria uma aproximação crescente com a temática do
trabalho, que retomei em variadas circunstâncias: nos estudos de pós-graduação,
na extensão universitária, e em outras experiências de gestão.
Efetivamente, a discussão da categoria
“Trabalho” foi uma constante na trajetória acadêmica e profissional aqui
analisada. Nos estudos do Mestrado em Administração, a questão posta era a
reação dos trabalhadores à conclamação dos empregadores pelo comprometimento
dos empregados com os programas de qualidade. Na década de noventa, em
particular, havia um forte apelo do discurso empreendedor no sentido de que a
busca da competitividade das empresas exigia a adoção das técnicas associadas
ao toyotismo, de melhoria contínua da qualidade.
Crescia a importância de uma concepção sobre
qualidade no processo produtivo que se alinhava com a noção de Produção Enxuta,
ou clean, exigindo uma estratégia permanente de redução de custos,
através dos programas de Qualidade Total, especialmente na estruturação dos
Círculos de Qualidade. Parte fundamental do novo paradigma da produção impunha
a necessidade do comprometimento dos “colaboradores”, ou “engajamento” no dizer
de Benjamin Coriat, em “Pensar pelo Avesso”. Significava dizer que novo papel
estava reservado nestes programas para os próprios empregados da produção,
historicamente alijados do processo de planejamento ou gestão. Foi nos
“Princípios da Administração Científica” que Frederick Taylor defendeu
explicitamente a necessária separação das funções gerenciais e operacionais,
fenômeno já presente na indústria e que ganhou contornos “científicos”. Por
este sistema, os trabalhadores da produção deveriam ser orientados a fazer o quê,
como e quanto, não lhes cabendo questionar.
Com o toyotismo, percebe-se o quanto o
capital perdia de produtividade por não incorporar o saber operário na melhoria
dos processos. Embora alguma autonomia devesse ser distribuída, não
representava nenhuma perda importante para o controle gerencial. Nada que não
fosse possível contrabalançar com as efetivas contribuições e sugestões
oriundas do “chão de fábrica”.
A questão, no entanto, não foi sempre
pacífica. Ao contrário, o sindicalismo, embora influenciado pelas novas ideias,
reagia ao que considerava mais uma forma de exploração da força de trabalho.
Discutir este assunto aplicado à realidade de duas empresas baianas do ramo da
metalurgia, que implantavam programas de qualidade, foi o objetivo central do
projeto de pesquisa desenvolvido no mestrado.
Alguns artigos científicos, e um capítulo no
livro “O trabalho no Século XXI”, foram produzidos a partir dessa discussão,
que apresentava uma abordagem crítica aliada à descrição dos métodos e técnicas
características.
As concepções toyotistas consolidaram-se
rapidamente, adaptadas que foram aos diversos campos da produção de bens e
serviços, com impactos em diversas dimensões da organização das empresas, das
relações de trabalho, e dos arranjos produtivos.
A indústria automotiva e a sua cadeia
produtiva seguem se constituindo como importante segmento econômico na geração
de valor, no impulso à inovação, e na oferta de empregos. Por isso mesmo, este
setor foi objeto de políticas públicas que influenciaram o rumo da indústria no
Brasil.
Os estudos do Mestrado desdobraram-se
imediatamente para o Doutorado, voltando-se para um aspecto que amedrontava
como nunca os trabalhadores: o crescente desemprego.
Com o avanço do pensamento neoliberal,
retomando sob novas bases as ideias clássicas de Adam Smith, acerca do afastamento
do Estado das atividades econômicas, o governo Fernando Henrique Cardoso, dá
espaço a concepções gerencialistas, que tentam reproduzir na administração
pública as mesmas ideias que prosperavam no setor privado.
Enquanto concepções teóricas denominadas
“pluralistas” propagavam “o fim do trabalho” e, em consequência, o “fim das
classes”, tentando sepultar a centralidade da categoria “trabalho” para a
compreensão da sociedade, o desemprego grassava, mantendo-se alto até mesmo
quando havia sinais de recuperação da atividade econômica. Reforçavam-se os
argumentos de que não mais haveria ocupação para todos, ao menos na forma em
que estávamos acostumados a perceber: através de relações de trabalho estáveis,
protegidas por contratos de trabalho e convenções coletivas, resultante de
conquistas históricas.
Apesar de defender a consigna de que a melhor
política pública é a não política pública, o governo FHC estabelece o Regime
Automotivo Brasileiro, que tinha como objetivo ampliar os investimentos
estrangeiros no setor, mediante um conjunto de concessões fiscais e benefícios
variados. Através desse mecanismo criava-se, simultaneamente, a expectativa de
ampliação das oportunidades de emprego a partir da construção de novas plantas
automotivas.
Na Bahia, anunciava-se a possibilidade de
instalar montadoras de automóveis. O arranjo institucional previsto no Regime
Automotivo em nada se assemelhava ao sistema de elaboração das políticas
públicas até então adotado: as Câmaras Setoriais. Moldadas a partir de concepções
“meso corporatistas”, as Câmaras se constituíam em espaço privilegiado para os
diversos atores - organizações de empregadores e empregados, governo, e outros
entes envolvidos diretamente - participarem dos debates que antecediam a
definição das regras a serem obedecidas para investimento em diversos setores
da economia.
Discutir as políticas públicas de emprego
implantadas pelo governo federal no âmbito do Regime Automotivo Brasileiro era
o objetivo principal dos estudos de doutoramento. Entre os objetivos do
trabalho estava a análise das inovações gerenciais e tecnológicas na indústria
automotiva, com ênfase nos novos arranjos organizacionais da planta da Ford
Motor Company, que se projetava implantar nas proximidades do Polo Petroquímico
de Camaçari.
Os estudos se concentraram na análise da
redução do emprego naquele setor industrial, a despeito das políticas públicas
de incentivo ao investimento e implantação de novas unidades fabris. A pesquisa
conclui relacionando um conjunto de fatores que causavam o enxugamento do
emprego no setor, entre os quais:
- no âmbito do processo de formulação das
políticas, observa-se o predomínio do diálogo governamental com as montadoras,
sem que os demais atores tivessem capacidade de influenciar decisivamente nas
diretrizes que passaram a ser adotadas;
- em consequência, não havia contrapartidas
objetivas dos empreendedores, que representassem compromisso com a geração de
empregos;
- a redução do emprego também era impactada
pela reestruturação produtiva e adoção de estratégias que não privilegiavam a
verticalização da produção com implantação de unidades de fornecedores nas
proximidades do complexo industrial da montadora de veículos;
- também a mudança da política macroeconômica
do governo federal promove a sobrevalorização da moeda nacional, promove a
“flexibilização” do mercado de trabalho, e induz a desnacionalização do setor
de autopeças;
O modelo teórico pluralista/racionalista é
fundado nas ideias econômicas neoclássicas. A suposição do pluralismo é que, em condições normais, de equilíbrio, a
representação de interesses dos inúmeros grupos políticos resulta em benefício
para o conjunto da sociedade.
O método neoclássico – o “individualismo
metodológico” - considera que todos os fenômenos sociais devem ser
compreendidos como um produto da ação dos indivíduos e que este comportamento
individual é ‘totalmente racional’, ou seja, é movido por uma busca de
maximização de benefícios. Assim, um eleitor ou um consumidor, diante de
alternativas que lhes são apresentadas, escolhe aquela que acredita servir
melhor aos seus objetivos. Este debate, evidentemente, se expande para
diferentes campos do conhecimento.
Neste período, publiquei
alguns artigos relevantes em revistas nacionais, assim como, em anais de
congressos nacionais e estrangeiros, entre os quais, destacaria aqueles
desenvolvidos em parceria com o meu orientador, o Prof. Dr. Francisco Lima Cruz
Teixeira. Estes textos versaram sobre as inovações tecnológicas e gerenciais no
processo industrial, os sistemas de produção, e a divisão internacional do
trabalho no setor automotivo. Outros artigos
trataram do debate teórico subjacente à formulação de políticas públicas, temáticas essas exploradas em minha tese de
Doutoramento. No âmbito da divulgação e popularização do conhecimento,
mantive estreita colaboração com a edição baiana do jornal Gazeta Mercantil,
publicando dezenas de artigos relacionados, especialmente, à indústria
automotiva.
A experiência docente no ensino superior é
iniciada em desdobramento do Mestrado em Administração. Desenvolveu-se nos
cursos de Economia e de Direito da Universidade Católica do Salvador, com a
disciplina “Ciência Política”. Em continuidade, na Escola de Administração da
UFBA, ministrei as disciplinas “Estruturas e Funções de Governo” e “Finanças
Públicas”. Esta atividade sofreu grande influência dos debates e leituras sobre
“Estado e Sociedade”, disciplina ministrada pelo Prof. Antônio Pinho, no Núcleo
de Pós-Graduação em Administração da UFBA. Simultaneamente,
ministrei aulas na Pós-Graduação na Universidade de Feira de Santana, na
Universidade Federal da Bahia, e na Faculdade Ruy Barbosa.
O ingresso no CEFET-BA
Obtido o grau de Doutor, e com razoável
experiência no ensino de graduação e pós-graduação, participei de Concurso
Público no CEFET-BA, concorrendo ao cargo de Professor Adjunto, em Regime de
Dedicação Exclusiva, para a área de Administração, resultando na aprovação e
posterior posse, em junho de 2002. O Memorial então
apresentado fundamentava-se em minha Tese de Doutoramento, cuja defesa pública
ocorrera seis meses antes.
Ao ingressar no Cefet-Ba, na área do Ensino, assumi duas
disciplinas da área de Administração da Produção, bem como, a coordenação da
atividade Trabalho Monográfico. Passei a integrar, também, o Colegiado do Curso
de Administração. Simultaneamente, criamos e liderei o Grupo de Pesquisa
Trabalho e Tecnologias de Gestão, com três linhas de pesquisa, entre as quais
“Inovações Tecnológicas na Indústria” e “Empreendedorismo e Economia Solidária”.
A atuação na extensão, em particular no campo da Economia
Solidária, decorreu da experiência com o Bansol - Banco Solidário, quando
docente na UFBA. Iniciativa que envolveu estudantes e professores em uma ACC -
Atividade Curricular em Comunidade, compartilhada com os professores Genauto
França e Suzana Moura, que articulava o ensino, a pesquisa e a extensão naquela
universidade.
Assim, no ano de 2003, há quinze anos, portanto, coordenei o
processo de criação da ITCP – Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares
do CEFET-BA, da qual me afastei em fins de 2006, em decorrência da assunção de
outras responsabilidades. A ITCP permanece em funcionamento com a missão de
outrora: o apoio ao desenvolvimento de empreendimentos solidários. Esta missão
envolveu ao longo desse período, sob a coordenação da Profa. Tatiana Dias
Silva, e dos professores Carlos Alex Cypriano e Thyrso Maltez, diferentes
ênfases em aspectos da sua atuação, enriquecendo com a experiência e
enfrentando os velhos e novos desafios.
A Incubadora foi criada no esteio de uma política pública
conduzida pelo Ministério de Trabalho e Emprego, através da Secretaria Nacional
de Economia Solidária - SENAES. Por meio de chamadas públicas, o MTE, em
parceria com outras instituições estatais, financiava iniciativas acadêmicas
nas universidades, com o objetivo de apoiar o desenvolvimento de
empreendimentos econômicos e cooperativas populares, como alternativa de
geração de renda e empoderamento de grupos excluídos dos sistemas formais de
trabalho e emprego.
A primeira experiência, surgida ainda na década de 1990, vinculada
à Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, serviu de balizamento para
outras tantas Incubadoras, inclusive a ITCP-Cefet/Ba, a primeira em uma
instituição educacional de ensino tecnológico.
Não se objetivava, em visão restrita, de ensinar aos pobres como
deveriam se inserir na economia capitalista de forma organizada, mas de
desenvolver um Programa crítico de valorização do processo coletivo, da
autogestão, com bandeiras ecológicas, de consumo consciente, de comércio justo,
de moeda social, de crédito solidário, de construção de uma outra economia. São
valores indissociáveis à economia solidária, que é também um movimento político
dos cooperativados em torno de uma plataforma de reivindicações.
Com a instalação da ITCP objetivou-se discutir os conceitos da
economia solidária na comunidade cefetiana, envolver estudantes, técnicos e
professores, bem como, a comunidade do entorno, na perspectiva de um trabalho
extensionista, sempre articulado com a pesquisa. Esta atuação visou dotar os
empreendimentos de capacidade para trilhar em torno de três eixos de atuação:
político-ideológico, organizacional/associativo e econômico/produtivo. Em
termos metodológicos a ideia se baseava nos princípios da educação popular e na
pesquisa-ação.
Simultaneamente, a ITCP atuou no sentido de aprofundar a
formulação sobre os conceitos subjacentes à economia solidária, contribuindo no
debate em ambiente acadêmico. Desde então inúmeras atividades foram
desenvolvidas, seja com o apoio do Ministério do Trabalho, Governo da
Bahia/Fapesb ou do MEC, neste caso no âmbito do Programa de Extensão –
PROEXT/MEC, sempre com o apoio institucional do Cefet/IFBA.
Objetivando a difusão dos conceitos de incubação e cooperativismo
entre os estudantes de Administração, sob influência dos docentes que
integravam a ITCP, foi aprovada a inclusão no Currículo da disciplina optativa
“Associativismo, Cooperativismo e Economia Solidária” (ADM 573). De início
ministrada pelo Prof. Carlos Alex Cypriano, na atualidade, a
disciplina está sob minha responsabilidade, com oferta semestral.
Nos primeiros quatro anos de atividade no Cefet-BA fui responsável
por diversas funções, entre as quais: a Coordenação do Curso de Administração
e, posteriormente, do Curso de Especialização em Gestão de Instituições
Públicas de Ensino (CEFET/BA); a liderança do Núcleo de Estudos em Trabalho e
Tecnologias de Gestão - Grupo de Pesquisa registrado no CNPQ; a Coordenação da
Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares; e outras funções
administrativas. Também atuei como Membro da Câmara de Assessoramento
Técnico-científica na Área de Ciências Sociais Aplicadas, da FAPESB; Membro
Titular do Comitê Assessor de Ciência e Tecnologia - CEFET/BA; e Membro Titular
do Conselho Diretor do Cefet/IFBA, representante eleito pelos docentes da
carreira do Magistério Superior.
No campo editorial, integrei os Conselhos Editoriais das revistas
ETC, do então Cefet-Ba, e da revista Debate Sindical, editada em São Paulo.
A articulação de atividades de ensino, pesquisa e extensão
permitiu-me orientar mais de duas dezenas de alunos em suas monografias de
conclusão de curso, de iniciação científica, de pós-graduação, vinculado ao
NPGA/UFBA, e integrar dezenas de bancas de graduação, mestrado e doutorado, em
especial na UFBA, Uneb, Unifacs, além do próprio Cefet-Ba.
O engajamento cidadão na política estadual, bem como a dedicação
ao longo dos anos com a temática do Trabalho, levam ao convite, aceitação e
autorização do MEC, com a anuência da gestão do Cefet-Ba, a assumir o cargo de
Secretário Estadual do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte - Setre, em janeiro
de 2007, prolongando-se por toda a gestão do Governador Jaques Wagner,
inclusive o segundo mandato, encerrado em dezembro de 2014.
A gestão na Secretaria do Trabalho
Foram oito anos e inúmeros desafios. A pasta incluía duas
autarquias a ela subordinadas, com responsabilidades nas áreas do Esporte e do
Artesanato, e duas outras superintendências na administração direta, com
programas de grande relevância social.
Entre as realizações mais significativas estão a reestruturação do
serviço de intermediação de mão de obra, com a implantação do Sinebahia; a
ampliação da rede de agências de microcrédito Credibahia em dezenas de
municípios, a contratação das obras de construção da Arena Fonte Nova; a
construção do Centro Pan-americano de Judô e do Ginásio Estadual de Cajazeiras;
a implantação da Agenda Bahia do Trabalho Decente; a implantação do Programa
Qualifica Bahia de cursos de qualificação social e profissional; a implantação
da Superintendência de Economia Solidária e dos Centros Públicos de Economia
Solidária e Editais de fomento nas áreas de finanças solidárias e produção;
implantação do Conselho Estadual de Cooperativismo e aprovação do primeiro
Plano Estadual para o setor; implantação do Conselho Estadual de Economia
Solidária, entre outras iniciativas.
Priorizo neste relato a abordagem de um Programa cuja temática nos
é cara por suas implicações sobre a valorização do trabalho e pela clara
relação com a trajetória aqui analisada. Trata-se da Agenda Bahia do Trabalho
Decente, uma iniciativa original que mereceu destaque da Organização
Internacional do Trabalho pelo ineditismo do seu desenvolvimento no nível
subnacional, e pelos mecanismos participativos que deflagrou na construção de
uma Agenda Estadual, com objetivos e metas bem definidas.
Trabalho Decente é conceito desenvolvido pela OIT significando um:
“trabalho produtivo e de qualidade, em condições de liberdade,
equidade, segurança e dignidade humanas, sendo considerado condição fundamental
para a superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da
governabilidade democrática e o desenvolvimento sustentável.” (ILO, 1999)
A aplicação prática deste conceito implica que cada país
estabeleça as suas diretrizes prioritárias de modo a aproximar as condições de
trabalho locais daquele marco conceitual.
Ao longo do último século, observou-se no Brasil, importantes
conquistas para os trabalhadores do ponto de vista da organização sindical, da
regulamentação das relações do trabalho, da implantação dos Tribunais do
Trabalho, do Ministério Público do Trabalho, do FGTS, do FAT e do Ministério do
Trabalho e Emprego. A existência destas instituições assegurou políticas
públicas continuadas na regulação e fiscalização do trabalho, a manutenção do
sistema público de emprego de qualificação e intermediação de mão de obra, do
seguro desemprego, das normas sobre saúde e segurança do trabalho, entre outras.
Com o impeachment da presidenta Dilma, contudo, o governo Temer
inicia um processo de desmontagem desse legado histórico, com alterações na
legislação do trabalho, nas funções do Ministério do Trabalho, e nos demais
instrumentos de promoção do trabalho.
O processo até então em andamento, de redução dos chamados
déficits de Trabalho Decente sofrem um duro golpe. Aumenta a “flexibilização”
tão reclamada pelos empregadores, com o aumento da precarização das ocupações,
e regulamentação do trabalho eventual, subordinando o direito ao trabalho
apenas ao interesse do empregador.
Vários indicadores, que já apresentavam com perfil ruim tendem a
se agravar com a falta de uma política de valorização do trabalho. É o caso,
por exemplo, os acidentes de trabalho, cujo número de mortes por ano no país
mantém-se em torno de 2,7 mil, tendo havido 13,3 mil mortes, entre 2012 e
2016. Considere-se o agravante que as estatísticas existentes abarcam
apenas os segurados, portanto, os acidentes com trabalhadores informais não são
contabilizadas.
Também a desigualdade no mercado do trabalho se reflete na elevada
taxa de desemprego entre os jovens. O desemprego é, ainda, maior entre mulheres
que homens, apesar do crescimento da participação feminina no mercado. Da mesma
forma, há mais desempregados entre negros que entre brancos, assim como, as
estatísticas são desfavoráveis aos afrodescendentes quanto ao rendimento e
qualidade da ocupação.
O trabalho forçado e o trabalho infantil, duas das maiores chagas
na área do trabalho, tendem a se elevar com a redução de gastos com as
políticas sócias, e de combate à pobreza e a fome, além de medidas
complementares de estímulo à inserção produtiva, e à melhoria da qualidade de
vida.
Nos dois últimos anos, depois de aumentos reais de 80% no valor do
salário mínimo, entre 2003 e 2016, observaram-se perdas nos reajustes
autorizados pelo governo para aquele valor de referência.
O mercado de trabalho também se mostra restrito para as pessoas
com deficiência (PCD) a despeito de toda a legislação que impõe cotas aos
empregadores. É indispensável, ainda, estimular as políticas já existentes que
levam em consideração as diferenças entre o trabalho urbano e rural,
garantindo, por conseguinte, tratamento diferenciado, que proteja as populações
rurais, possibilitando condições propícias de vida e produção, principalmente
aos agricultores familiares.
Entre as medidas antipopulares, o governo federal eliminou os
repasses a estados e municípios para as políticas públicas de trabalho,
ameaçando a permanência do Sinebahia e do programa de qualificação profissional.
Assim, mais que nunca, é necessário perseguir os objetivos
estabelecidos desde 2007, na Bahia, com a primeira Agenda do Trabalho Decente
em nível subnacional no mundo, segundo a própria OIT, servindo de parâmetro
para sua política.
Construída de forma participativa, a Agenda expressa compromissos
prioritários, e decorreu da necessidade de mobilizar a sociedade em torno de
temas que lhe são caros e estruturar uma política de trabalho que pudesse
abranger as suas mais variadas dimensões e complexidades.
A Agenda Bahia do Trabalho Decente baseia-se no funcionamento de
um Comitê Gestor integrado por dezenas de instituições públicas estaduais e
federais, bem como representativas de empregadores e empregados e outras
organizações da sociedade. Ao Comitê compete articular as ações desenvolvidas
pelo conjunto de instituições, tendo por referência as metas definidas para cada
eixo prioritário.
A experiência resultou também na publicação de vários artigos em
congressos do CLAD – o Centro
Latino-americano de Administração para o Desenvolvimento, assim
como no encontro da Associação Brasileira de Estudos do Trabalho – ABET,
além de um livro editado pela OIT, que sistematiza o programa e serve de
referência no desenvolvimento de agendas subnacionais.
Eleito para presidir o Fórum Nacional de Secretarias
Estaduais de Trabalho – Fonset, por quatro mandatos (2009 a 2012; 2014), foi possível
interagir com outros estados e o governo federal, levando para além das
fronteiras da Bahia, as concepções anteriormente referidas sobre a valorização
do trabalho e as necessárias políticas públicas para materializar aqueles
objetivos.
A participação nas reuniões do Conselho Deliberativo do Fundo de
Amparo ao Trabalhador – Codefat, composto pela representação dos trabalhadores,
dos empregadores e governo, e onde o Fonset tem assento como instituição
convidada, permitiu debater as deliberações ali adotadas, em particular no que
se referiu a destinação de recursos para a intermediação para o trabalho e a
qualificação profissional.
Um dos debates mais significativos ali desenvolvidos diz respeito
à sustentabilidade da política pública financiada pelo Fundo. Ano após ano os
gastos com as obrigações do Fundo cresciam em proporção maior que as suas
receitas efetivas, comprometidas em grande parte com a chamada DRU –
Desvinculação das receitas da União, que retirava vinte por cento das receitas
originais.
Apesar do crescimento do emprego no período 2003-2016, cresceram
as despesas com o Seguro Desemprego - SD e o Abono Salarial, despesas
impactadas não apenas pelo crescimento do contingente de assalariados formais,
mas também pela política de valorização do Salário Mínimo.
Curiosamente, mais empregos gerados significa maior despesa com o
SD, pois a rotatividade do mercado de trabalho manteve proporção semelhante ao
que se observava no período anterior. Ao mesmo tempo, a política de desoneração
fiscal para setores específicos da economia, cujo desempenho o governo federal
considerou necessário estimular face à crise econômica, também atingiram as
receitas do FAT.
Teoricamente, a política de desoneração fiscal impacta
positivamente os setores beneficiados, podendo contribuir para a sustentação do
emprego e a dinâmica da economia, sendo difícil avaliar o quanto o impacto
negativo imediato nas receitas do FAT eram justificáveis frente aos benefícios
decorrentes das isenções.
Assim, o ajuste das contas baseou-se no corte das despesas com os
benefícios trabalhistas, e a adoção de novas exigências para acessar o seguro
desemprego. Ficou evidenciada, contudo, a necessidade de revisar os mecanismos
de modo a assegurar a sustentabilidade da política pública financiada com recursos
do FAT.
A passagem pela administração pública estadual rendeu importantes
homenagens, a exemplo da Ordem do Mérito do Judiciário do Trabalho, no
Grau de Comendador, concedida pelo Tribunal Superior do Trabalho; da Medalha
Thomé de Souza, concedida pela Câmara de Vereadores de Salvador; e mais
recentemente, da Comenda 2 de julho, maior honraria concedida pela Assembleia
Legislativa do Estado da Bahia.
De volta ao IFBA
Encerrada a gestão à frente da Setre, após oito anos no
desempenho das funções de secretário de estado, e com importante bagagem
administrativa, retornei à instituição, sendo convidado a responder pela função
de Assessor Internacional do IFBA. As atribuições do cargo estavam relacionadas
ao acompanhamento dos estudantes no Programa Ciência sem Fronteira e outras
iniciativas em cooperação internacional, à difusão de oportunidades para
servidores participarem de programas de intercâmbio internacional, mas
sobretudo conduzir estratégia de efetiva internacionalização do Instituto.
Neste particular, devem ser destacados os elementos estruturais
que precisam ser superados, dentre os quais o mais determinante consiste na
limitação no domínio de línguas estrangeiras, inclusive o inglês. Esta
limitação não se restringe à nossa instituição, tanto que, o governo federal
instituiu simultaneamente ao programa Ciência Sem Fronteiras - CsF, as
iniciativas Inglês sem Fronteiras e Francês sem Fronteiras.
A internacionalização requer, entre as ações prioritárias, a
oferta de cursos regulares em língua estrangeira, de modo a apresentar
alternativa aos estudantes de outras nacionalidades. Não é possível pensar a
internacionalização apenas na perspectiva de oferecer aos estudantes
matriculados no IFBA uma experiência no exterior. A intenção da internacionalização
deve estar espelhada nos materiais publicados, tanto de divulgação científica
como institucionais, no Portal da internet, nos diversos meios de comunicação,
exibindo informações em pelo menos mais um idioma, além do português.
Há um longo caminho a percorrer pela instituição neste campo,
valorizando o setor e melhor aproveitando a relação desenvolvida por docentes
com instituições estrangeiras, nos seus processos regulares de pós-graduação e
pesquisa.
Experiência no MCTI
Mais uma vez, um convite significativo, que contou com a pronta
concordância da Reitoria do IFBA, permitiu-me, dentro da cooperação dos
Ministérios da Educação e da Ciência Tecnologia e Inovação, assumir importantes
funções no MCTI.
Sem dúvida, uma experiência que propiciou aprofundar conhecimentos
acerca do processo de financiamento da ciência e tecnologia no Brasil, foi a
assunção ao posto de Assessor da Coordenação dos Fundos Setoriais do Ministério
de Ciência, Tecnologia e Inovação, assim como, a designação para substituto
eventual da secretaria executiva do mesmo MCTI.
Questão de grande complexidade, a constituição e o gerenciamento
dos fundos de financiamento reunidos no FNDCT - Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia corresponde a uma construção
institucional que exigiu a aprovação de inúmeras leis que estabelecem as
origens e destinações dos recursos para cada um dos catorze setores
considerados estratégicos. Setores tão diversos quanto o automobilístico, a informática,
aeroespacial, naval, etc.
Particularmente, em 2015, quando desenvolvi as mencionadas
funções, esse sistema de financiamento sofria com os efeitos da crise sistêmica
do capital e suas repercussões fiscais no Brasil. Na prática, apesar de contar
com mais de 5 bilhões de reais no orçamento naquele ano, os recursos
disponíveis não eram suficientes para arcar com compromissos já assumidos em
exercícios anteriores, além de limitar enormemente a capacidade da gestão.
Em uma comunicação que foi publicada no jornal A Tarde, em
dezembro de 2015, detalhei as particularidades dos limites impostos à
administração do FNDCT, ao discutir os impactos da crise na política nacional
de ciência, tecnologia e inovação, apontava o paradoxo que se apresentava: “a
retomada do crescimento requer o aumento da produtividade do trabalho, com
maior qualificação da mão de obra e ampliação dos investimentos em tecnologia,
a exemplo do que se alcançou no setor aeronáutico, sobretudo com a Embraer.” Ou
seja, a crise restringia os investimentos em tecnologia, o que, por sua vez,
limitava as possibilidades de superar a mesma crise.
No modelo dos fundos setoriais, os tributos arrecadados pela União
em diversos setores econômicos seriam direcionados para desenvolver
tecnologicamente as respectivas áreas. Dois outros Fundos – Infraestrutura e
Verde Amarelo – foram criados com a finalidade de apoiar a cooperação entre
universidades, centros de pesquisa e empresas, e para fomentar a infraestrutura
das instituições de C&T.
A Lei que regulamentou o FNDCT, em 2007, numa complexa engenharia
institucional, destinou os recursos dos fundos setoriais então existentes,
assim como em ações denominadas transversais – que perpassam os vários setores
simultaneamente, em áreas consideradas estratégicas para o país – a exemplo do
Reator Multipropósito, do Acelerador de Partículas Sirius e do Satélite
Geoestacionário são financiados com recursos do FNDCT.
No entanto, sucessivas leis e decretos orçamentários transferiram
dotações do FNDCT para a Reserva de Contingência, e, ao mesmo tempo, permitiram
que a arrecadação atendesse a outras despesas, como no caso do Programa Ciência
sem Fronteiras. O resultado é que os Fundos Setoriais ficaram reduzidos a menos
de 10% do que é efetivamente arrecadado pelos diversos mecanismos tributários,
para financiar a sua atividade.
Recompor as receitas do FNDCT, restringir o contingenciamento dos
recursos, fomentar projetos estratégicos, garantir maior participação dos
Fundos Setoriais no bolo orçamentário são medidas apontadas como indispensáveis
para que o país possa avançar no desenvolvimento tecnológico e científico.
Simultaneamente, é preciso avançar nos processos de avaliação dos
resultados na aplicação dos recursos, e ampliar os investimentos de C&T
mais vinculados às necessidades do setor produtivo, de modo a garantir melhor
impacto na atividade econômica.
Mudanças na gestão, contudo, precipitaram meu retorno ao IFBA,
onde um honroso convite do Reitor Renato Anunciação, para assumir a
Pró-Reitoria de Ensino, se traduziu numa oportunidade de contribuir com a minha
instituição. Conheci o Instituto mais profundamente, mas encontrei um contexto
de virada da política nacional, com enorme impacto para a Rede Federal de
Educação Profissional e Tecnológica, como de resto para a Educação e em tantas
outras dimensões do poder público e da vida dos brasileiros.
Pró-Reitoria de Ensino
Centenária instituição de ensino, fundada em
1910, o IFBA é herdeiro de uma longa tradição na Educação Profissional - da Escola de Aprendizes Artífices da Bahia à Escola
Técnica Federal, do CENTEC ao CEFET. Na atualidade, cumpre a difícil tarefa de
consolidar um rápido processo de expansão, que levou o instituto a 22 cidades
baianas em menos de dez anos.
As crescentes restrições
orçamentárias, após um período de relativa disponibilidade, expõem as
limitações para o alcance das metas institucionais. Com mais de 1300 docentes,
o Instituto oferta mais de 100 cursos técnicos, e mais de 50 cursos superiores,
tendo observado uma ampliação importante nos cursos de pós-graduação stricto sensu.
A constituição do Conselho
de Ensino, Pesquisa e Extensão, e as respectivas Câmaras, é uma dessas
conquistas a comemorar, e permitirá um tratamento mais aprofundado destas
temáticas essenciais. Por outro lado, a previsão legal de contribuir para
o desenvolvimento econômico local e regional e dos arranjos produtivos e
culturais locais, é desafio a ser equacionado, e dependerá de maior engajamento
dos servidores técnicos e corpo docente na realidade territorial.
O debate sobre a Reforma do Ensino Médio,
contudo, assume relevância e centralidade para os Institutos. A Educação
Profissional, sobretudo na forma integrada e subsequente, constitui compromisso
prioritário dos IFs. Muito embora o governo federal tenha proposto e o
Congresso Nacional aprovado, a Reforma do Ensino Médio (Lei n° 13.415/2017),
os dispositivos que tratam diretamente da Educação Profissional na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação – LDB, não foram alterados.
Entretanto, a aprovação da Base Nacional
Comum Curricular – BNCC do Ensino Médio poderá introduzir alterações
significativas, sobretudo nos cursos integrados. Não se discute a necessidade
de mudanças na educação. A evasão, o baixo índice de aprendizagem, a deficiência
na formação do professor são questões destacadas sistematicamente pelos
especialistas.
A questão, no entanto, é que a Reforma do
Ensino Médio longe de encaminhar soluções, retoma uma estratégia que contribui
para tratamento desigual no processo educacional.
Uma das principais mudanças introduzidas pelo
denominado “novo” ensino médio, e apontada como vantagem, é a possibilidade que
passa a ter o estudante de escolher entre cinco “itinerários” ou áreas, aquela
que pretenda se aprofundar: matemática, linguagens, ciências da natureza,
ciências humanas ou formação técnica profissional.
Atualmente, esta escolha é feita pelo aluno
quando se propõe a ingressar na Universidade, e não raras vezes convive nos
primeiros anos com o conflito sobre a opção feita, cogitando frequentemente a
mudança de curso.
Diferentemente da estratégia adotada pela
Universidade ao criar os bacharelados interdisciplinares, como uma primeira
etapa na qual o universitário amadurece a escolha sobre o seu futuro percurso
formativo, agora, a difícil decisão deverá ser antecipada.
Os jovens serão levados a escolher seu
caminho ao final do ensino fundamental, pois terão que escolher uma escola que
ofereça o itinerário que considere ser o mais provável seguir, caso contrário,
serão obrigados a mudar de escola ao final do segundo ano, o que seria
igualmente prejudicial.
Isto decorre de uma segunda e relevante
novidade: as escolas não terão condições de oferecer todos os cinco itinerários
formativos previstos, devendo se tornar especializadas em uma ou duas áreas.
Isto porque, a oferta de um terceiro ano com aprofundamento desdobra-se na
necessidade de contar com mais docentes para a área específica e infraestrutura
laboratorial.
Outra grave consequência da mudança é a
separação do ensino médio do ensino técnico-profissional. Assim, o ensino
integrado, típico dos institutos federais de Educação Tecnológica, como o IFBA
e o IFBaiano, poderia ser alterado, caso se consolide a reforma em curso.
Um dos aspectos mais significativos,
presentes na criação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia,
é formação de cidadãos críticos, conscientes do seu papel na sociedade, em
contraposição com a formação tecnicista, cujo foco principal e quase exclusivo
era formar trabalhadores aptos a ingressar no mercado de trabalho, sem uma
perspectiva de desenvolver suas capacidades intelectuais, criativas e
inovadoras.
Ao contrário, a nova BNCC limita enormemente
a oferta de disciplinas, sendo as únicas consideradas obrigatórias, o ensino de Língua Portuguesa e Matemática. No caso
específico do ensino da História, Sociologia, Filosofia e Geografia, são
fragmentadas e passam a ter ênfases diferentes para cada itinerário formativo.
Por outro lado, a formação docente é outro
dos grandes desafios atuais. No entanto, ao permitir que professores com
"notório saber" possam ministrar aulas para os cursos técnicos, a lei
contraria o enorme esforço proposto pela Lei que instituiu o Plano Nacional de
Educação, que fixou como meta garantir que todos os professores da educação
básica tenham licenciatura ou formação pedagógica.
A discussão sobre os “caminhos” do Curso
Integrado é indispensável para a sociedade e para o IFBA, em particular, sem
perder a perspectiva do conjunto das suas atribuições no campo da Educação
Profissional.
De volta à sala de aula
Encerrada a minha participação à frente da
PROEN, retomo as atividades no Campus Salvador, no segundo semestre de 2017.
Retorno às salas de aula para atuar, dentre outras, na condução da disciplina
“Introdução à Administração”, com duas turmas dedicadas aos cursos de
Administração, das Engenharias e de Análise e Desenvolvimento de Sistemas.
Leciono, ainda, a disciplina “Associativismo, Cooperativismo e Economia
Solidária”, bem como, a disciplina “Trabalho de Conclusão de Curso.
Afastado do cotidiano da sala de aula, das
atividades extensionistas e da pesquisa por largo período, paulatinamente, este
conjunto de atribuições são retomadas. A reintegração à Incubadora Tecnológica
de Cooperativas Populares - ITCP permite a aproximação com abordagens
recém-incorporadas, a exemplo das Tecnologias Sociais.
A retomada das atividades típicas do fazer
docente foi associada ao trabalho editorial, como Editor Chefe da recém-criada
revista “Ensino em Foco”, editada sob a responsabilidade da Pró-Reitoria de
Ensino, e dedicada ao debate de temas relacionados à Educação, particularmente
a Educação Profissional, e ao processo de ensino/aprendizagem. Da mesma forma,
integro os Conselhos Científicos das revistas Laborare e Dialética.
Complementarmente, atuo como avaliador ad hoc nestas
publicações, assim como, integro a equipe de pareceristas da revista Educação,
Tecnologia e Ciência – ETC, a mais antiga do IFBA; e na atual edição do
Encontro Nacional de Pós-Graduação em Administração – o Enanpad 2018.
Encerrando o relatório
Concluo assim este relato, que foi elaborado
para dar suporte ao processo de avaliação do Memorial, como etapa obrigatória
para a promoção à Classe de Professor Titular do Instituto Federal da Bahia.
Ao longo deste registro, a despeito da linha
geral que procuramos descrever em torno das discussões sobre trabalho e
educação profissional, é possível perceber, o que também se reflete na Ficha de
Pontuação das Atividades, uma diversificação de campos de atuação.
Obviamente, a “Ficha” com pontos atribuídos a
cada área, deve ser entendida de forma estrita, ou seja, como instrumento de
avaliação que estabelece parâmetros e critérios para o trabalho da Comissão
Especial, sendo desejável a sua constante adequação.
De todo modo, é possível afirmar que há uma
contribuição significativa, por tudo já descrito, o que a nosso ver, credencia
a avançar na carreira docente.
O Instituto tem enormes desafios para
manter-se fiel à sua missão institucional de oferecer educação gratuita e
pública, e contribuir na formação de cidadãos críticos com formação
profissional de qualidade. A consolidação do Instituto depende do compromisso
com a excelência do ensino, por todos aqueles que o integram e o constroem
cotidianamente.
O Estado brasileiro investiu ao longo de cem
anos nesta rede federal, e não se pode perder a perspectiva da contribuição que
pode dar no desenvolvimento de tecnologias e inovações tão necessárias a uma
inserção internacional nos tempos atuais.
Mais que isto, é importante ter em mente a
necessidade de mudanças no paradigma produtivo/consumista, que esgota a
natureza, e transforma seres humanos em peças de uma engrenagem infernal, que
massacra homens e mulheres, promovendo sofrimento físico e mental,
submetendo-os a condições de trabalho exaustivas, ou o completo abandono,
quando rejeitados por não ter “perfil” para que tenham o direito de se submeter
ao sistema de exploração.